sábado, 20 de março de 2010

Uma terra feliz - I


Enquanto arrumava alguns jornais mais antigos, encontrei um pequeno escrito no jornal “O Ilhavense”, de 15 de Novembro de 1994, da autoria de António Maria Lopes”, com o titulo de “Uma Terra Feliz” e que também tinha sido publicado na revista “Ilustração portuguesa” nº 504. Este artigo relata bem o que foi a nossa Gafanha em tempos mais recuados.

Quem ler o título supõe logo: - não é em Portugal, decerto, essa terra feliz. Coloca-a na Suiça, ou sai mesmo da Europa, transpõe o Atlântico e imagina-a nos confins da América.
Engano. É um ninho de paz e de trabalho, um recanto mimoso de verduras, ignorado, escondido sobre areias de Portugal, no concelho de Ílhavo.
Exige naturalmente o leitor, mesmo antes de conhecer o nome da povoação, que se lhe indiquem a causa e os motivos que concorrem para qualificar sob tão sedutor adjectivo esse encanto do nosso pais.
Bem simples.
É feliz essa terra porque lá não se pede esmola!
E eis nisto todo o seu valor.
O seu povo não tem feitos políticos, sociais ou religiosos que lhe definam carácter etnográfico. O livro dourado da História não apresenta uma única folha a atribuir-lhe gestos heróicos, guerreiros, altruístas, denunciando a natureza do sangue que lhe corre nas veias.
Não é gente que pertença ao cinema da política, nem desta seja comparsa neste decurso de trevas e de luz em que a nacionalidade portuguesa tem desenrolado a fita cinematográfica da sua existência.
Terra pacífica, meiga e alegre como um beijo de mãe, caído nos lábios de um filho, forma como que uma pequena pátria nesta grande pátria nacional.
E sabeis já porquê.
Porque lá não se pede esmola!
E eis nesta afirmação a síntese luminosa de uma redentora lição de civismo, de influência salutar para quantos povos lhe queiram seguir o exemplo. Essa lição bem poderia ser apontada à hoste dos sem trabalho que ultimamente pululam pelos centros citadinos, e entre os quais a própria capital possui um avultado stock.
Abençoado berço de homens é esse, onde cada um deles sabe ganhar o pão de cada dia, sem estender a mão à caridade.
E sabe-o ganhar porque, desde criança, todo o seu ser se prende à paixão sublime de saber amar o trabalho.
Encontro neste tempo regional de português de fundo étnico de raça de grande valor social, invulgar, desconhecido e que parece o leva a afastar-se sistematicamente dos enredos da política e das teorias avançadas das modernas aspirações sociais.
O valor da sua missão civilizadora e progressiva é contudo muito notável, visto que só pelo esforço do seu braço e da sua acção individual tem transformado extensas dunas de areias em campos que são verdadeiros jardins.
Essa terra chama-se Gafanha; é uma povoação moderna, de tipos fortes, loiros, requeimados pelo sol, vendendo saúde.
(Continua)

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